quarta-feira, 13 de abril de 2011

Supermercado: terreno das perdições da gula e dos olhares incriminadores

Grande Austeróbilo,

Não faço feira em qualquer lugar porque sou gordo. Meu negócio é hipermercado. Daqueles com condicionadores de ar e radialista, antes desempregado, anunciando as promoções do dia.

Armário vazio. Entrarei no antro de perdição calórica que todos têm medo. Nunca faça feira sozinho. Leve aquele amigo viciado em cálculos e economia que vai te dizer sempre que os R$0,48 pelo quilo da melancia é 3x mais vantajoso e 480% menos calórico que o que você quase compra.

Lição Básica. Todos os corredores levam a chocolates e biscoitos! Querendo ou não, tem sempre um Bono que acidentalmente cai no carrinho. E você o esconde entre os vegetais, frutas e ‘isopores’ centeio que você finge comer.

Com peso na consciência, segue para as barras de cereais, símbolo máximo da dieta moderna. Entre os inúmeros sabores, você escolhe os mais saudáveis: soja, ração e alpiste. Não adianta. Todos só perceberão o biscoito. Te olham julgando o quão pouco de força de vontade tem. Você os ignora. Foi um mês sem seu Bono e todo bom homem merece um Bono.

Não encontrando feijoada diet, se contenta com um novo shake que promete te fazer perder cinco quilos em três horas. Sabor soja, com ômega 3, claro. ‘De soja’ é o novo ‘desnatado’.

O pior de ir a um hipermercado fazer compras é a sensação de que não vale a pena. Pensar que você está gastando três vezes mais dinheiro por duas vezes menos comida e quarenta vezes menos de prazer.

Na fila, o malhado do caixa 12 te olha com uma cara quase de nojo, enquanto o guri de grandes olhos encara fixamente sua barriga. Minutos, e diversos abacaxis, depois, o guri continua lá, na mesma posição. Você chega a conclusão de que ele é autista. Na dúvida, derruba uma lata da prateleira no pé dele. Hum... era mal educado mesmo.

É impressionante como investigamos as feiras alheias. É como em farmácia, que sempre imaginamos o que a senhora de 82 anos faria com um preservativo GG extra-lubrificado, sabor morango turbinado. Um sorriso geral de “essa aí vive”.

Quase que por último, o caixa passa o biscoito. Faz um comentário escroto sobre o elemento que não pertence ao conjunto. Você só não o manda se lascar porque o sorriso sem dentes apresentado parece ser castigo suficiente.

Grandes sacolas em cada braço. Corre desesperado quando vê o Avenida Norte/Macaxeira se preparar para deixar a parada. O próximo, só em 76 anos!

No alto do coletivo, você sua. E sua. Chega a conclusão que ao menos a comida já virá com molho embutido. O cobrador não entende que a catraca que você normalmente já não passa, não se abrirá magicamente enquanto você carrega dezenas de sacolas. Todos veem o Bono. E te julgam por isso.

Você desce duas paradas depois, em Santo Amaro. O motorista, que não suporta gordos diz “vai fazer bem a caminhada”. Você o manda tomar, mas ele já não ouve. Uma das sacolas rasga. Com os sorrisos generalizados que te cercam, as outras sacolas decidem seguir o exemplo. Risos agora são gargalhadas. Todos têm prazer na desgraça alheia.

Em meio ao caos e a comida já suja, você é saqueado pro menores famintos. Sai no tapa com um guri de 12 anos que te ameaça com uma faca. Antes ser esfaqueado, que perder o Bono. Ele corre. Você tem consciência que de nada adianta juntar as compras. Você também não agüenta correr, então provavelmente será assaltado. No calor do momento, você se vira à sombra mais próxima, senta. Você e seu Bono. Com suor e tudo, a mordida nunca foi tão doce. Ele derrete na boca, mais pelo calor, claro, mas não importa. Nada importa.

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