quinta-feira, 31 de março de 2011

Quem pouco cuida, muito vive (É dia de praia)

Todo brasileiro tem medo de morrer de fome, não de intoxicação alimentar. Isso é um fato. Tanto que qualquer sinal de preocupação com a maneira correta de lavar os alimentos, por exemplo, é encarada como fonte de frescura, não de profilaxia.

Dia de folga + dia de sol = dia de praia. E é à beira-mar que temos os maiores sinais de que quem pouco cuida, muito vive. Sentado na cadeira de madeira, torrando os ombros com o sol convidativo de um sábado de libertação, loiras ao lado (uma, a que desce redondo, a outra que ‘dá’) e o campo de observação está preparado.

 Em pouco tempo chega o primeiro caso. Ai, camarão de praia! Não tem melhor, tem? Pode observar que não tem ‘ao coco’ ou ‘alho e óleo’ que supere o limão e suor do camarão de bacia da praia. É o tempero do saco plástico, junto com a bacia mal limpa e as mãos do vendedor que compõem o sabor tão apreciado da iguaria marítima.

Por falar em frutos do mar (por sinal, nunca entendi o porquê de usarmos ‘frutos’), e a tal da ostra? Todo mundo sabe que aquelas de bar não estão com nada. Elas são tipo ostras criadas com vó. O negócio é aquele baldinho, com ostras amontoadas, recém tiradas da água (desde a manhã anterior, claro) ainda com pedacinhos de areia. Junta então aquele azeite aberto há uma semana, que leva sol dias inteiros, exposto à areia, e um limão meio amarelado vindo no chão de um carro qualquer da CEASA. Não tem melhor. Melhor que isso, só agarrando em sua goela...

Falar em praia é falar em vários lanchinhos clássicos de nossa vida. Afinal, quem nunca comeu aquele cachorro-quente especial da tia na praia? Aquele mesmo que, rege a lenda, usam papel higiênico para engrossar o molho? Que beleza! As ervilhas chega descascam. A lingüiça, toda enrugada, meio que com vergonha. O pão despedaçando. E a batata palha sequinha em cima? Hum!

Melhor que isso, só a maionese da tia. Essa não tem igual. Você pede (claro), e ela te dá o potinho, já quase vazio. Segundos depois, hora de repor. Nisso ela tira aquele balde de tinta de 15 litros com a massa batida, acrescenta um ovo para deixar no ponto. Quando está menos verde, está bom. Agora, repondo. Escorre um pouco do lado e quase cai, não fosse o dedo rápido do marido da tia para colocar o restinho para dentro. Tudo fechado, passando um guardanapo na boca do frasco e pronto! Tudo para seu deleite.
Em praias mais requintadas tem até lanchonete. Com direito a hambúrguer preparado na hora e batata frita. Um McPraia! A chapa engordurada dá aquele gostinho de bacon em qualquer carne. Chega dá gosto de ver quando ele limpa a espátula no canto do fogão. Uma beleza.

 A batata frita que acompanha é daquelas do estilo do Cais de Santa Rita, sequinha, melhor que qualquer fast food árabe que tem por aí. Daquelas que o segredo é deixar o óleo de dois dias assentar, para então ferver tudo em temperatura média. Tiro e queda! Sem gordura trans!

Forrado o estômago, a continuidade é no tira-gosto. Nada melhor que caldinho de peixe ou feijão, vendido em garrafa térmica, já notou? O segredo, além do sol na garrafa, é a montagem do copo. Quando a tia pega o torresminho e o ovo de codorna com a mão e põe no copo, e enche com aquela gosminha deliciosa, sem deixar você desistir antes. Nisso, esqueceu da azeitona, que tira do bolso a tempo. Na hora de provar, qual não é a preciosidade?

Dia quente, chega sempre a hora do picolé. O de palito não dá. A Kibon deixa tudo muito impessoal. O negócio é o picolé de saquinho (no sul, sacolé), daqueles que os pirralhos semi-tuberculosos enchem, aos sopros, antes de preencher com o ki-suco. Sensacional. Só perde mesmo para o raspa-raspa, feito com aquela pedra de gelo manuseada trezentas vezes em uma corrida, com um raspador enferrujado bem amoladinho e temperado com a mão do ‘raspadeiro’. Eita, beleza! É justamente naquele contato com a unha do raspadeiro que a mágica acontece. Quando as garrafas, tampadas com um isopor quase marrom chega ao copo, a alquimia já está pronta. E não adianta tentar reproduzir em casa. Não é a mesma coisa.

Depois disso, tomar banho de mar. Não, a maré não está alta, a vazão do sistema de águas municipais é que foi acrescida na manhã de hoje! E se joga na areia para tomar sol, junto aos cachorros dos catadores de latinhas que te pedem sua Skol ainda cheia. “Daqui a pouco, amigo”. E você pensa que se estivesse em um desses restaurantes quaisquer da cidade, bastava uma alface mal lavada, para te derrubar. 
Ali, você está em seu momento mais natural, na certeza que o sol tudo queima. Tranqüilo, lá vem o camarão denovo. “Três (copos) por cinco?”. Sem igual. Zero trans, zero ômega, zero riscos.

8 comentários:

  1. puta que pariu, ed! eu tomava esse dudu com particulas de semi-tuberculose e o raspa-raspa era sempre de "maçã-morango-e-côco"! mas anota aih: só tive diarréia provocada por camarão e batata frita de praia! o resto tah liberado pelo ministerio da saude.

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  2. Dispenso o camarão, a ostra, batata-frita, cachorro quente, sacolé... Maaass, eu adoro o caldinho de feijão!! kkkkkkkkkkkkkkkkk
    Beijos, Ed! Parabéns!
    Ass: Elly Rose Martins.

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  3. marcionila teixeira1 de abril de 2011 às 11:23

    Um dos melhores que já li...

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  4. Puta que pariu! Brother, eu como tudo isso... ou comia!

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  5. Ahhhh!!! Ta explicado pq é tão gostoso!!!

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  6. Eu estava animado para ler este post, até chegar na pérola "por sinal, nunca entendi o porquê de usarmos ‘frutos’"...
    Será que é porque moluscos, peixes, siris, camarões, etc. são ORIUNDOS do mar??? Lembra da oração "Ave Maria"??? "Bendito é o FRUTO de vosso ventre, Jesus"??? Ou pensavas que FRUTO seria a mesma coisa que FRUTA? Ou, pior, pensavas que FRUTO é necessariamente algo que dá em árvores??? Imagina só! Um pé de camarões! Seria um camaroeiro? MEO DEOS!

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  7. MEO DEOS! Tem gente que não entende uma ironia quando ouve (lê) uma...

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  8. Ótimo texto, apesar de não valer pra mim hehe. Não costumo comer na praia, ou quando como é no máximo o picolé impessoal da Kibon hauhauahu. Ok, ok, um pastel vá lá também, mas na barraca onde compro pastel o cara faz tudo na sua frente, lava a mão, usa luva de plástico pra manusear as massas, recheia na hora etc etc.
    Mas conheço muita gente que come o que as "tias" e os "tios" vendem. Bom alerta hehe

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