quarta-feira, 23 de março de 2011

Em bar, nunca se sabe o que pode acontecer (ou quem encontrar)...

Encontraram-se em um bar português não tão conhecido na cidade. Entre todas as opções de lazer para aquela sexta-feira à noite, tinham decidido passar as horas justo naquele lugar. Ela, na companhia de amigas e um casal italiano. Ele, com um daqueles casos de ‘entressafra’ ao qual você recorre sempre que a carência bate, junto a outros dois casais. Apenas menearam as cabeças, como velhos colegas que perderam contato, mas não faziam questão da companhia.
- Quem é ela?, perguntou Rafaela, forçando o tom indiferente.
- Ninguém. Conhecida de muito tempo atrás.
- Ela não tira os olhos de você...


Não queria, mas sorriu. Não tinha intenção, mas gostou. Não via Célia há bastante tempo, mas, por certo, não tinha ficado nem um pouco menos atraente. Entre uma piada e outra que o amigo contava, olhava por sobre os ombros. Ela estava com os cabelos mais longos e já não havia traços de seu ‘período loiro’. Seu olhos castanhos pareciam mais brilhantes. Estava feliz. Procurou, mas em seus dedos não havia aliança. Em nenhuma das mãos. Foi pego, de surpresa, pelo olhar dela e apenas levantou uma das sobrancelhas. Ela sorriu.

- Você não vai mesmo falar com ele?
- Não temos o que conversar. Ele está sendo educado a ponto de cumprimentar e não fazer cena...
- Tanto tempo depois, acho que ele já nem lembra mais...
Talvez a amiga tivesse razão. Inconscientemente passou a mão pelos cabelos, colocando-os por trás da orelha. Sabia o quanto ele gostava daquilo. Se forçou a sorrir, como se estivesse se divertindo e a noite já estivesse completa. Se soubesse que seria colocada naquela situação teria colocado o vestido florido que pensou em usar, mas desistiu por achar que sentiria frio. Agora, com o calor lhe tomando o corpo, viu que não tinha sido a escolha mais acertada. Quando flagrou-o olhando em sua direção perguntou quem iria ao banheiro com ela e, de pronto, levantou-se. Precisava estar ainda mais bonita e, senão, pelo menos, com a temperatura controlada.

Viu claramente quando as pernas arquearam para deixar a mesa. Calça colada e blusa simples, como uma menina de interior, que ele, há tanto, admirava. Levantou-se pedindo licença e se foi na mesma direção, adentrando a área interna do bar. Pensou no que diria, mas não conseguia organizar as palavras. Na verdade, nem os próprios pensamentos eram claros. Ele e Célia já tinham passado por muito, juntos. Amigos que, vez ou outra, dormiam juntos por obra do destino ou da tequila mexicana. Sempre havia um motivo para que a relação não fosse para frente, em geral, pelo fato de ter namorado a irmã dela, antes de conhecê-la. O que parecia diferente agora?

Antes que pudesse responder, ela apareceu. Seu olhar claramente pedia auxílio da amiga que, sorrindo, se esgueirou pelo canto da parede e voltou à mesa.
- Não esperava te encontrar aqui...
- Você esperava me encontrar em algum lugar?
- Não... – silenciou – você está ainda mais bonita...
- Você – escolheu bem as palavras – parece saudável... – e continuou – Não precisamos fazer isso...
- Nunca precisamos fazer nada. Isso adiantou de alguma coisa?
- Adiantou. Você está bem. E bem acompanhado.
- Nem se você ouvisse isso de mim, acreditaria... – sorriram – Eu não queria te ver...
- Não vamos começar novamente...
- Nós quase demos certo.
- Nós quase começamos, você quer dizer... E foi bom, no final das contas...
- Eu quase me apaixonei por você, mas...
- E eu quase lhe matei de desgosto... Na época, você merecia. Ninguém me conhecia de verdade...
- Quase ninguém...
- Verdade. E quem conhecia nunca se entregou 100%. Te machuquei para que você crescesse. Para que quando você revisse ou ressentisse a marca, lembrasse o quanto somos responsáveis por quem se gosta...
- Entendo agora. E não há o que nos impeça...
- Você está acompanhado! – disse, elevando um pouco a voz.
- ELa? Ela não é ninguém...
- Eu já fui ninguém. Acredite, não é bom. Será que você não toma jeito?
- Estou perto. Quase lá. Sei o que falta, mas...
- Quem quase vive já morreu... – lembrou-o, com a voz falhando – Quem sabe um dia... ?
- Até que você ponha um anel no dedo?
- Ou você. Ou que desistamos. Só sei que não se faz história em cima de tentativas, apenas de escolhas... Vou voltar. Fique bem. – disse, sem olhá-lo nos olhos.

Voltou à mesa com um ar diferente. O ‘caso’ já parecia irritada, como se esperasse ser dispensada, mas tudo que recebeu foi um beijo voraz. Apaixonado, quase. Como há meses não experimentava. Apenas ouviu quando ele disse “Vamos sair daqui?” e balançou a cabeça, com felicidade, enquanto se despedia dos amigos com poucas palavras. De mãos dadas, desceu as escadas do ‘Portuga’ como se conhece o lugar há anos. Passou a mão em seu peitoral, olhando-o nos olhos, que escondiam certo sorriso. Parecia que, de repente, as coisas dariam certo. Ele nunca a beijara assim. Era diferente. “Quem sabe agora?”, pensou, sem desconfiar que ele não olhava para trás, muito menos que ele quase desiste... Quase...

2 comentários:

  1. Cada linha, cada diálogo uma surpresa. Vc se surpreende com o passar da história e o fim...não é o q a gente pensa! Adorei. O q eu mais gosto é seu lado "machadiano" de descrever ambientes, gestos e pessoas...amo os detalhes.

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  2. esse lance de encontrar pessoas inesperadas, muitas vezes é uma guerra em nossa cabeça,não sabemos o que encontrar, uma pessoa comprometida, até com o mesmo sexo, pessoas que não dão a mínima para você, muitas vezes você quer distancia e assim vai, PAPO DE GUERRA

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