quarta-feira, 16 de março de 2011

Sem mulher, fica quem quiser...

Lamentava pelo amigo, mas, no fundo o achava patético, com aquela cara de triste num restaurante de segunda, onde parecia que tinham ido matar o boi para colocá-lo no prato. Aos 28 anos, com um bom emprego e sem filhos, bastava não ter lepra ou um olho a menos para ele arrumar uma substituta para Lúcia em questão de horas. Será que ele não tinha lido as últimas histórias que mostrava que, para cada homem, havia seis mulheres solteiras (e desesperada)? Talvez ele estivesse naquela relação por tanto tempo que tinha desaprendido como era ser homem de verdade...
- Bicho, mulher tem muita. Você vai ali no supermercado da esquina, diz que está com dúvida entre o tipo de amaciante de roupa que precisa comprar e consegue pelo menos dois números de telefone, qual é a sua?
- Eu náo quero telefones, cara. Primeiro queria entender o que deu errado. Estávamos bem até outro dia...
- Que vocë saiba. Mulher sempre tem reclamação para fazer, não se engane.

Não chegou a perceber a jovem de cabelos escuros que ouvia, quase que sem intenção aquele discurso, torcendo involuntariamente o rosto, e continuou:

- A solução não é ficar repensando tudo que se passou na relação, pensando o que podia ter feito diferente ou o que ela devia ter relevado. Isso quem faz são elas. Você esquece, colocando outra no lugar...
- Você fala como se fosse a coisa mais fácil do mundo.
- E é. Você perdeu o jeito, mas já já volta à velha forma. Tem que falar mesmo, acreditar que o desejo pode, e deve, virar verdade, com as palavras certas...

Interrompeu o discurso ao perceber a jovem loira de seios fartos se aproximando, trazendo seus pratos. Baixinha (com aquela velha qualidade de 'encaixe perfeito'), ela não era magra, nem parecia muito inteligente. Também inspirava aquela ideia de que teria vindo do interior, mas tinha uma cara de que quando se solta...

- Essa daí, mesmo. Por que não fala com ela?
- No meio de um restaurante?
- O que é que tem, bicho? - disse, começando a comer - Essa daí é do tipo que você sussura no ouvido e diz que vai levar para dar um passeio no seu Pallas.
- Fala sério...
- E então, pede para ver a dispensa, a puxa pelo pescoço e sai descendo a mão por aquelas coxas, olha só... E o negócio era resolver ali mesmo, entre as batatas. O bom mesmo é comer devagar, mexendo bem, ouvindo-a pedir por mais, entre as batatas...
- Você é doente! - disse, sorrindo, enquanto via a garota de cabelos escuros começar a deixar a mesa, contrariada com o 'ambiente' - Você só percebe o melhor da mulher quando percebe que a está perdendo. Quando ela começa a fazer uma coisa boa para você, por obrigação, contrariada, com remorso. E ainda, assim, faz. Na esperança que a gente perceba onde erramos e cheguemos em casa diferente, mudado, com flores nas mãos...
- O que é que é isso? Flores nas mãos? Você tá de brincadeira comigo...
- A grande questão é que você faria isso, se soubesse que haveria como salvar algo, mas, normalmente, quando se percebe isso, já é tarde...

Foi interrompido pelo amigo que chamava a garçonete, com um irritante "filhinha". Ela, que conversava rapidamente com a solitária morena, que há pouco ouvia a conversa, enquanto ela pagava a conta... Já não ouvia bem os resmungos do amigo, que, de fato, não estava ajudando. Concordava apenas que era necessário seguir em frente... Percebeu quando a loira de seios fartos se aproximou com um sorriso intrigante no rosto, trazendo um balde extra de gelo para o whisky já 'danificado', que quase não era possível de ser engolido. Ao ajudar a fazer espaço na mesa, recebeu um pequeno papel de suas mãos delicadas.

- Sabe o que eu quero, docinho? - perguntou o amigo, com uma provocação barata.
- Que tal um pouco de leite condensado da dispensa para lambuzar o meu corpo enquanto vocë me come entre as batatas? - perguntou, alto, de súbito, sem tirar o sorriso da cara, agora cínico.
- Er... Náo. Somente o sal, por favor... - resumiu, incomodado com a risada alta do amigo que, agora, parecia de melhor humor que o dele, vendo a loira ir embora nada contrariada.

Lamentou pelo amigo, mas, no fundo, o achava patético. Ele não sabia o que era estar num relacionamento sério, muito menos a dor da perda ou a sensação de ter necessidade de recomeçar o que quer que seja. No pequeno papel, o recado: "você tem que começar escolhendo melhor suas companhias. 8758-9996". Riu. Adorava morenas afoitas, caladas. Talvez o amigo tivesse razão: não é fácil permanecer sozinho. Talvez fosse apenas sorte. De aprendizado ficou apenas que quem menos parece saber dos caminhos do coração, parece estar no caminho certo. E, por isso, decidiu curtir o momento ainda mais, querendo explicações do garanhão moralmente castrado, indagando-o com as sobrancelhas:

- Quem? Ela? - Respondeu, ainda sem compreender o acontecido - Nada. Puta! Se oferecer desse jeito? É fácil demais... Quem gosta?

3 comentários:

Related Posts Plugin for WordPress, Blogger...