quarta-feira, 17 de abril de 2013

Sintoma de paixão é saudade. Certeza de paixão é se sentir ridículo


É fácil perceber quando estou apaixonado. Sou ridículo. Canto como se disso dependesse meu sustento, distribuo votos - mais que sinceros - de bons dias, tardes e noites (sim, mais de uma vez) e ando como se tivesse visto passarinhos verdes, azuis, amarelos e de todas as cores que se possa imaginar. Quando me fisgam, fico rico. Cartão de crédito é besteira (na verdade, inimigo) e tudo vira desculpa para comemorar ou sair para beber e esquecer. Sou carinhoso com tudo e com todos, reparando em belezas e qualidades que sempre estiveram ali, mas que nunca me dispus a mencionar. Quando estou apaixonado, todos ganham.

É fácil perceber quanto quero alguém. Mando mensagens despretensiosas, sem horário ou assunto definido - para não dizer em todos os momentos possíveis e com controle suficiente para não parecer psicopata -, me faço disponível para ajudar no trabalho mais chato ou difícil (naquela tentativa de fazer uma diferença significativa) e ofereço sempre presentes baratos, mas com significados claros (daqueles que não dão na cara, mas também não se explica o porquê da exclusividade, saca?). Sou presente, sou ausente, quente e frio, ofereço os ombros, o corpo, a mente - que promete que não mente -. Quando estou apaixonado, sou uma versão melhor de mim.

É fácil perceber quando penso mais em outra pessoa que em mim mesmo. Ouço repetidamente uma única música, danço sem batuque, fico bêbado sem álcool e sou pego rindo no mais profundo silêncio. Sem motivos. Sem razões. Sem funções. Sorrio por lembrar das covinhas do rosto, por sentir nos braços o calor das pequenas costas, por ser invadido pelo cheiro de cabelos recém-lavados... E como não o faria? Como não planejar frases, preparar surpresas, fazer questão de acariciar, sem querer, a nuca? Quando estou apaixonado, inspiro romances ainda não inscritos.

É fácil notar quando algo chama minha atenção. Gaguejo como quem tropeça em três batentes em sequência, perco a capacidade de criar novos assuntos, convido para dançar junto quando não há uma alma perdida no salão, seguro o último camarão da mesa apenas para oferecer, faço brindes às pequenas coisas, poucos atos, tantos fatos e os ofereço, como quem não quer nada... Quando estou apaixonado, escrevo crônicas, cartas e poemas a Cruz e Souza, expondo o coração, já maculado, me fazendo o mar de Alphonsus de Guimarães, aguardando o salto da louca Ismália. Mato e morro por vinte centavos de atenção.

É fácil notar quando não estou apaixonado. Danço apenas na rotina industrial de minhas notícias, canto apenas vendedores atrás de descontos e durmo até tarde, sem muitos motivos para observar o nascer do exibido sol. Sou Gregório de Matos, desprovido da capacidade de acreditar na verdade da sorrateira paixão que se faz apenas carne e sangue no final. Me restam doses sequenciadas e pouco acúmulo de contas à cabeceira. Sem paixão, acho tudo ridículo. Difícil entender, bem sei. Facilita se há um "eu e você". Pode ser?

 

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