quinta-feira, 11 de agosto de 2011

Ser brega é desafiar o tempo e a memória das pessoas. Moda é para os fracos


Grande Austeróbilo,

Eu sou naturalmente brega porque sou gordo. Não esses ‘bregas’ esfrega-esfrega de hoje. Não, brega do sentido de usar calças lá em cima, ter todas as roupas de uma mesma cor, usadas na mesma ocasião, pochete e celular pendurado na cintura.


Sou brega, como todo gordo. Gordo que tenta ser mais Maurício, ou mais Patrícia, certamente será encarado como antipático e desagradável por aqueles que o conhecem. E aqueles a quem chama de amigos estão mais interessados em seu dinheiro. Sim, porque todo gordo que se dá o luxo de tentar deixar de ser brega é rico, ou quase. Ô, raça!

Gosto de gravatas de bolinha, chapéu em dia de chuva, lapela. Gosto de flores no paletó, abotoaduras, correntes de ouro, calças justas! Mas não importa o que você gosta, apenas importa o que pensam quando te olham. É mais fácil ser brega atual, do tipo que usa calções largos, shorts do tchan, Kolene no cabelo e Alfazema como perfume.

Os dias não são os mesmos. Tenho saudade de quando os tempos eram mais fáceis. Aquela idéia de que divagamos o quão melhor era o ‘nosso mundo’ em ‘nosso tempo’ nunca se fez tão real, tão presente, tão verdadeiro. Envelhecer significa complicar as coisas. Ou torcer para que não compliquem para você. Em vão. Sempre em vão.

Acho que invejo os seres indefesos. Daqueles que não precisam se importar com o sono alheio, uma vez com fome. Que não precisa fazer esforço nem para ir a um banheiro, quando se está tudo ali, perto, seguro, naqueles confortáveis cintos de utilidades Pampers.

Mais tarde, temos a obrigação moral de estudarmos e praticar caligrafia. De volta, assistir a desenhos animados, correr e ralar o joelho, uma vez por semana, dar um escândalo dentro de um supermercado, uma vez por mês, e quebrar um dente ou um braço, uma ao ano. A vida já começa a complicar, para quem só se importava na força com que sugaria belos e acolhedores seios, que nem sempre produziam leite exclusivamente com o intuito de alimentá-lo.

Poucos anos depois, cursinhos, presentes à primeira namorada, desistência da décima quarta dieta, escolha de uma profissão pro resto da vida. Pressão em busca da alegria que deveria animá-lo para o resto de sua, em geral, pobre existência. E o mundo gira em torno do ego dos que puderam e da inveja dos que não.

Pouco depois, primeiro emprego. Emprego não, estágio. E o mundo já parece ter ficado complexo em torno da administração metódica entre casa, faculdade e escravidão. Tudo parece entrar nos conformes quando se consegue comer com menos de dez minutos, na hora esperada, e gozar por mais de dez, na inesperada. Isso, e ouvir as risadas saudosas dos que dizem ‘já fui bom nisso’, como quem diz ‘você não sabe o que te espera’.

E nunca esperamos. A barriga cresce. Junto com as contas. Se a da sua mulher também cresce, as contas se dividem para, então, serem elevadas à potência. E você assiste de camarote o quanto a vida era fácil, quando seu único trabalho era abrir o berreiro e atrapalhar o sono dos que têm obrigação legal de não jogá-lo dentro de um cesto de roupas sujas.

E o tempo passa, as músicas que embalaram os momentos já não tocam. A mídia em que você costumava ouvi-las provavelmente nem mais existe. As contas só aumentam, dessa vez visitando mares nunca dantes navegados: remédios contra pressão alta, cirurgia de pedras em todos os lugares onde elas possam se instalar e exames regulares de próstata.

E você apenas pensa o quanto a vida é sempre mais fácil, quando olhada para trás. Pensa como o primeiro divórcio foi mais fácil que o terceiro, quando não tinha mais nada. Como o primeiro carro era mais resistente que esse de agora, apesar de mais barato. E se vê assim, como todo bom e dispensável objeto, que marca um momento de sua vida e passa.

Para marcar época, é diferente. Ninguém lembra o último vestido de Gisele Bunchen, mas lembra das cores de Falcão. Ser brega é, antes de qualquer coisa, dizer não à temporalidade. Deixando de lado os compromissos com o que já passou e vivendo eternamente um estilo que traz sorrisos, a si e a outros.

Às vezes penso que felizes são os gordos. Felizes são os bregas. Porque, talvez, no alto de nossa incrível mediocridade, não estejamos preparados para os momentos em que a vida complica, nem para deixá-la para trás. Por isso que nos voltamos ao passado como forma de nos reafirmarmos. Lembrando sempre de quando fomos mais bonitos, mais fortes, mais influentes. Idealizações de nós mesmos, mais firmes, mais belas e mais ilusórias que o girassol da lapela sobre a camisa estampada...

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